Um vendedor de cachorro-quente está há 16 anos com uma
reforma em casa que não cabe no bolso. Um aposentado não conseguiu pagar
tratamento particular para a mulher e a viu definhar no Sistema Único de Saúde
(SUS) até a morte. Um empresário não acredita que caiu em golpe.
Os três perfis diferentes exemplificam como são as 30 mil
pessoas que teriam sido vítimas de um suposto esquema de um advogado de Passo
Fundo que teria movimentado R$ 100 milhões.
As contas do empresário foram bloqueadas e a preocupação da polícia
é que caso novos clientes que teriam sido enganados não apareçam, o dinheiro
apreendido possa até retornar ao escritório.
O suposto esquema foi desarticulado na sexta-feira em uma
operação da Polícia Federal no escritório de advocacia de Maurício Dal Agnol.
Desde a década de 1990, ele se especializou em ações contra a antiga Companhia
Riograndense de Telefonia (CRT).
A suspeita da PF (que cumpriu mandado na luxuosa casa do
suspeito, com direito a boate no seu interior) é de que ele repassaria apenas
um valor irrisório aos clientes das ações ganhas. A motivação veio após várias
denúncias contra o advogado em que os clientes, representados por novos
defensores, argumentavam merecer mais do que haviam ganho.
Foi o caso de Edegar Teixeira de Almeida, 67 anos, morador
da Vila Victor Issler, vendedor de cachorro-quente que recebeu R$ 18 mil, mas
que deveria ter ganhado R$ 206 mil.
- Minha nora é recepcionista e foi trabalhar na festa de 15
anos da filha dele (Dal Agnol). Ganhou R$ 80 para ficar a noite lá, enquanto só
de decoração foram gastos R$ 300 mil. Pensei: não dá meu dinheiro e ainda usa
pra fazer festa? - desabafa Almeida
Então ele entrou na Justiça e conseguiu ganhar outros R$ 46
mil.
- Poderia já ter terminado minha casa. Mas aqui estou,
esperando o resto, fazendo aos poucos - diz, em meio à reforma que dura mais de
15 anos.
Ele conta que recebeu uma ligação do próprio Dal Agnol em
1997, falando que ele teria direito a receber dinheiro da antiga CRT.
"Não temos como investigar 60 mil ações", diz
delegado
Em 2005, o atual presidente do Sindicato das Indústrias de
Material Plástico do Estado, Edilson Luiz Deitos, também teria virado cliente e
vítima:
- Ele (Dal Agnol) fazia contato com empresas de
contabilidade que, na boa-fé, ofereceram o serviço e nós, na boa-fé, aceitamos.
Chegava dinheiro de tempos em tempos, com prestação de contas e tudo, mas só
fomos nos dar conta que era um valor incorreto quando fomos procurados por um
advogado de fora - conta o empresário.
Já no caso de Carmelina Helena Comin, que deu origem ao nome
da operação da PF, o dinheiro chegou tarde.
- Nos disseram: daqui uns oito anos chega o dinheiro.
Passava lá duas vezes por ano, especialmente quando minha mulher adoeceu porque
teria ajudado muito. Mas ele (Dal Agnol) sempre dizia: ainda não chegou -
lembra-se o marido José Bianchin Gheno, 70 anos.
Na verdade, segundo a PF, enquanto Carmelina lutava contra
um câncer, a ação foi ganha e o dinheiro teria sido recebido pelo advogado em
2010. A verba só chegou depois de Gheno contratar um advogado novo e receber R$
124 mil em 2013, um ano após a morte da companheira.
O risco, agora, segundo o delegado Mário Vieira Soares de
Morais, é que o montante bloqueado da conta de Dal Agnol retorne ao escritório.
- Não temos como investigar as 60 mil ações cíveis que o
escritório dele já moveu — explica o delegado.
A PF orienta que se a pessoa suspeite ter sido vítima, o
ideal é pedir que o processo seja desarquivado e revisto.
(Fonte: Zero Hora).
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