A denúncia de aliciamento de jovens
para participação em atos de protestos não é exclusividade do Rio. Radicais que
lideraram as manifestações em junho de 2013 nas ruas de Porto Alegre teriam
recrutado delinquentes em bairros da periferia da Capital para engrossar os protestos
e gerar tumulto. A informação consta de investigações realizadas pela Polícia
Civil e que começam a ser enviadas à Justiça. Depoimentos de testemunhas, de
policiais, de guardas municipais e de pessoas detidas no ano passado indicam
que moradores de pelo menos três zonas periféricas teriam sido arregimentados,
com a promessa de obter caminho livre para saquear lojas e veículos na área
central. As investigações estão em 86 inquéritos realizados por quatro
delegacias – parte deles sob apreciação do Judiciário, distribuídos em
diferentes varas criminais. Cada uma dessas averiguações aborda um fato: são
depredações, saques e até agressões, nas quais há várias pessoas indiciadas. O
cruzamento das informações aponta um modo de operação em manifestações e os
objetivos dos recrutamentos. Diferentemente do que ocorre no Rio, onde há a
suspeita de pagamentos para promover quebra-quebra (o advogado de Caio Silva de
Souza, detido pela morte do cinegrafista Santiago Andrade, afirmou que seu
cliente recebia R$ 150 por manifestação), em Porto Alegre o “lucro” dos
depredadores se daria de outra forma: a preferência nos saques no comércio e em
veículos. Conforme documentado nos inquéritos, o suposto aliciamento começou
com a atuação de líderes de grupos radicais, que teriam contatado patrões do
tráfico dos bairros Bom Jesus, Cruzeiro e Vila Conceição. A proposta seria de
que jovens dessas regiões fossem enviados aos protestos, com a promessa de ter
liberdade para saquear e furtar. Com a aliança estabelecida, os chefes das
comunidades enviavam jovens sem ideologia ou reivindicação às manifestações,
onde encontrariam líderes de grupos radicais e mascarados. Na reta final das
passeatas, quando as depredações começavam, pessoas com o rosto coberto iam à
frente, arrombavam comércios e, logo depois, ordenariam a ação dos saqueadores.
Com os jovens furtando produtos – como celulares e outros eletrônicos –, os
mascarados, em geral ligados a ideologias extremistas, se retiravam. Nestes
momentos, a Brigada Militar se concentrava em abafar os saques, enquanto os
radicais se deslocavam para fazer depredações e pichações como protesto
político em outras áreas com mais liberdade, longe da vigilância policial. Um
PM cedido como agente da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) em Porto
Alegre detectou, em junho, o suposto recrutamento de delinquentes para as ações
políticas. Ele falou com jovens do bairro Bom Jesus que disseram terem sido
convidados por um “patrão” do tráfico a comparecer no centro de Porto Alegre,
para saquear lojas, durante os protestos. A orientação seria seguir os
militantes políticos e furtar nos locais já depredados. O informe foi repassado
à Polícia Civil. PMs do serviço reservado (P2) foram ouvidos nos inquéritos e
confirmaram ter identificado suposto elo entre radicais e delinquentes. Eles
apontaram militantes misturados aos saqueadores. Dois depoimentos de
manifestantes presos em flagrante dão mais detalhes. Um dos supostos aliciados
era da Vila Maria da Conceição e disse ter sido convidado a participar dos protestos
por outros dois criminosos. Descreveu que “um mascarado de preto dava gritos de
ordem para indicar os locais que seriam atacados”. Por fotos, ele reconheceu
pelo menos cinco líderes vinculados a grupos políticos extremistas. Outro
indivíduo detido à época é um traficante do Morro Santa Tereza. Ele afirmou que
a tática “era atrair a Brigada com os saques para facilitar o quebra-quebra
político”. Ainda não há indiciamentos nos dois casos. “Tenho certeza de que
essas investigações vão dar resultado e comprovar vínculos que até agora eram
só suspeita”, diz o procurador Gilberto Thums, que atua na 6ª Câmara Criminal
do Tribunal de Justiça e teve acesso a depoimentos tocados por quatro
delegacias e que já estão na Justiça. Um dos responsáveis por investigações de
episódios de depredação e saques nas manifestações, o delegado Marco Antônio
Duarte de Souza foi procurado por ZH, mas não quis dar detalhes. “A Polícia
Civil evita falar em vinculações políticas. O que interessa é o fato criminoso
e o autor, mas ninguém terá imunidade”, declarou. (Zero Hora. Capa e páginas 4 e 5.
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