MAIS UM ROUND NA BRIGA PELO DIREITO DE INVESTIGAR (Zero Hora - Página
30) Enquanto a lei segue inalterada no Congresso e o tema não é pacificado na
Justiça, a Polícia Civil e o Ministério Público (MP) continuam em guerra pelo
direito de investigar crimes no Rio Grande do Sul. As relações entre as duas
instituições voltaram a azedar na quinta-feira depois de oito suspeitos, presos
por tráfico de drogas em uma operação do MP em parceria com a Brigada Militar,
serem liberados na 3ª Delegacia de Pronto Atendimento da Polícia Civil, na Capital.
Embora a delegada Ana Luiza Caruso tenha justificado a medida sob o argumento
de ilegalidades na captura dos suspeitos, afirmando que a BM não poderia
cumprir mandados de busca e monitorar conversas telefônicas, para o MP o motivo
da soltura faz parte de uma postura bem mais abrangente: um ranço da Polícia
Civil pelo fato de o MP ter realizado a investigação. Independentemente de quem
tem razão, o assunto é polêmico e gera debates pelo país. Na Câmara dos
Deputados, uma comissão especial discute a Proposta de Emenda à Constituição
(PEC) nº 37, que dá poderes de investigação exclusivos para as polícias Civil e
Federal. E, no Supremo Tribunal Federal (STF), tramitam ao menos oito ações
diretas de inconstitucionalidade sobre o tema. “A Constituição não diz expressamente
que o MP pode investigar, mas deu poderes para denunciar crimes, e existem duas
decisões da 2ª Turma do STF entendendo que, se o MP tem poderes para acusação,
precisa dos meios para isso. Assim, implicitamente, poderia investigar”, diz o
advogado Otávio Piva, professor de Direito Constitucional das escolas
superiores da Magistratura, da Magistratura Federal e a do Ministério Público. Segundo
Piva, a Corte ainda não se posicionou em definitivo e, enquanto o Plenário do
STF não julgar, seguirá a confusão. Particularmente, Piva entende que o MP está
certo: “É preciso abrir mão dessa briga de beleza para o bem da sociedade”. Alexandre
Wunderlich, também advogado e professor de Direito Penal e Constitucional na
PUCRS, é contra o MP investigar, mas admite que essa posição tem sido derrotada
no STF e no Tribunal de Justiça do Estado. Mesmo avesso ao poder investigativo
do MP, Wunderlich afirma que, quando vai a campo, o MP faz um trabalho mais
qualificado do que o dos policiais. “No MP, os controles são mais rígidos, os
advogados se sentem mais seguros, não ficam tão vulneráveis, sem negativas de
acesso aos autos. A estrutura do MP é mais organizada, talvez porque seleciona
o que vai investigar, enquanto a polícia tem de atuar em tudo”, afirma o criminalista.
Conforme o sociólogo Juan Mario Fandino, do Núcleo de Estudos da Violência da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a briga só traz prejuízos: “Quando
isso acontece, a sociedade se sente menos protegida e passa a confiar menos nas
instituições de segurança”. PORTO ALEGRE
O QUE PENSAM:
CORONEL SERGIO ROBERTO DE ABREU, COMANDANTE-GERAL DA BRIGADA
MILITAR: “Não vejo ilegalidade da BM em cumprir mandados, pois há um termo de
cooperação de combate à criminalidade firmado pelo governador do qual fazem
parte a BM, a Policia Civil e o MP. A BM não faz investigação criminal, nem
escutas, a não ser quando faz parte de uma estrutura conveniada como a
existente”.
RANOLFO VIEIRA JUNIOR, CHEFE DA POLICIA CIVIL: “Não tenho
conhecimento do caso e por isso não posso avaliar se a decisão dela (delegada
que liberou presos) foi certa ou errada. O promotor já me ligou antes, mas eu
disse que não posso obrigar um delegado a lavrar ou não flagrante, como não
posso ligar para ele pedindo para denunciar ou não alguém”.
MARCELO DORNELLES, SUBPROCURADOR-GERAL PARA ASSUNTOS
INSTITUCIONAIS DO MP: “Vejo esse assunto com muita preocupação. Isso tem
acontecido de forma reiterada. Duas vezes eu liguei direto para o chefe de Polícia e isso nunca se resolve.
Vou procurar a Secretaria da Segurança Pública. O prejuízo é da sociedade.Está
muito clara a postura de ser contra o trabalho do Ministério Público ajudado
pela Brigada Militar. É uma disputa de classe pelo poder de investigar”.
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