quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

FARRA DO PÓ NO PRESIDIO


Farra do pó no presídio - "Não existe controle no Central", afirma juiz sobre tráfico de drogas no interior de penitenciária.
Juiz da Vara de Execuções Criminais Sidinei Brzuska diz que é a primeira vez que assiste a um vídeo com teor feito dentro do Presídio Central
Nos quatro anos anteriores a 2014, segundo o juiz, a apreensão de drogas dentro do Central chegou a 60 kg, dos quais apenas 20% foram apreendidos nas revistas. O restante entra por caminhos nebulosos e alimenta farras DE COCAINA.
O surpreendente, segundo Sidinei, é o vazamento das cenas, que, além de expor a total FALTA DE CONTROLE DO ESTADO dentro das galerias, pode ter diversas implicações, tanto no âmbito das organizações criminosas quanto no político.
Diário Gaúcho – As imagens o surpreenderam?
Sidinei Brzuska – O que aparece ali não é nenhuma novidade. O vídeo é bem explícito e revela uma coisa que acontece não só naquela galeria, mas também em outras, em que sabemos que existe alto consumo de drogas. Temos relatos de familiares e de presos que saem das galerias e nos contam esse tipo de coisa. A novidade desse vídeo é que, pela primeira vez, alguém teve coragem de vazar as imagens. Isto eu nunca tinha visto acontecer.
DG – Mas o senhor já teve acesso a imagens com este tipo de conteúdo antes?
Sidinei – Não. É a primeira vez. Já pegamos telefones com selfies de presos, um fotografando o outro com armas no peito, por exemplo, mas sempre imagens individuais, onde apenas uma pessoa se coloca em risco e não vai querer se queimar permitindo que isso vaze. É a primeira vez que vejo filmarem o interior da galeria e a coletividade, aquela quantidade de presos envolvidos.
DG – É possível identificar pela imagem qual o pavilhão onde a farra do pó aconteceu e, a partir disso, supor quem teria comandado a festa?
Sidinei – Pelo que eu vi, é a primeira galeria do pavilhão B, historicamente dominado pela facção dos Abertos. 
DG – Que penalidades estes presos podem sofrer por conta deste episódio?
Sidinei – Do ponto de vista da execução da pena, isto tem uma interferência quase insignificante. Identificados os usuários, serão punidos por consumo, provavelmente com uma suspensão de visita por 30 dias, rebaixamento da conduta carcerária, talvez um isolamento por dez dias. Essa é a pena que o Estado aplica. Mas o preso que faz isso não está preocupado com essa consequência. A preocupação é da facção que controla o lugar em se manter no comando, e com a divulgação desse vídeo isso pode mudar. Identificado pela administração quem patrocinou a droga e fez a festinha, esse criminoso vai ser retirado da galeria, e isso sim é uma penalidade pra ele, porque enfraquece o comando. Só que ele vai cobrar essa conta de quem fez e de quem vazou o vídeo, e a pena pra esses camaradas é bem mais severa. A pena aplicada pelas facções é a morte.
DG – Do ponto de vista institucional, que consequências o senhor acredita que pode ter a divulgação destas imagens?
Sidinei – O que a administração do Central pode fazer é retirar o plantão da galeria, assim como o governo do Estado pode retirar o diretor do Central. Mas estas duas medidas terão impacto zero no controle de drogas lá dentro. Seria mais uma resposta política.
DG – Que medidas poderiam ser tomadas para impedir o uso de drogas dentro da cadeia?
Sidinei – Estas medidas teriam que passar pela desconstrução do Central. Com a estrutura física e de engenharia que ele tem hoje _  com galerias abertas, sem grades internas, sem guardas vigiando, sem câmeras de segurança filmando o que acontece lá dentro _ não é possível ter absolutamente nenhum controle sobre isso. Hoje, no térreo, antes dos três andares de galerias onde ficam os presos, existe um corredor onde fica a inspetoria que, no entanto, não tem qualquer visualização do que se passa nas galerias. Em cada uma delas, existem olheiros, os campanas. Se um brigadiano resolve ir até lá ver o que está acontecendo, antes que ele chegue, toda a galeria já foi avisada pelo olheiro de que o PM está chegando. Não há forma de controle sobre isso.
DG – Qual o panorama da circulação de drogas nos corredores do Central?
Sidinei – Apenas duas galerias são livres de drogas. Isto representa de 2% a 3% da população total do Central. E essas galerias são assim não por vontade do Estado, mas por vontade dos presos. Eles não aceitam drogas e expulsam quem tenta entrar com drogas lá. Mas nos últimos quatro anos, sem contar 2014, que ainda não está com dados finalizados, a apreensão de drogas dentro do Presídio Central chegou a 60kg. Isso torna, possivelmente, o quarteirão do Central o local onde mais se consome drogas no Estado. Proporcionalmente, no meu entendimento, é um pequeno município onde a maioria das pessoas consume drogas.
DG – E qual é a porta de entrada destas drogas?
Sidinei – Apenas 20% dessa quantidade apreendida nos últimos quatro anos é pega nas revistas, o resto é apreendido nas galerias. A apreensão de drogas com visitantes é caracterizada por pequenas quantidades. As grandes porções de drogas devem fazer o mesmo caminho que as armas, um caminho que não passa pela revista. É muito difícil fazer uma acusação sobre responsáveis por estas entradas, mas, no ano passado, por exemplo, tivemos a prisão em flagrante de um policial que entrou com 1kg de maconha e R$ 4 mil. É uma possibilidade (a entrada por policiais). Também tem as entradas pelos muros, por arremesso. Não é excluída essa forma, assim como as visitas, mas não para grandes quantidades.
DG – Dá para imaginar alguma maneira de retomar o controle perdido?
Sidinei – A mudança disso implica numa mudança cultural que é a mais difícil de todas. O preso não pode ser provedor da galeria. Tudo o que tem na galeria não foi provido pelo Estado, a não ser um ou outro colchão, parede, luz e água. Todos os demais bens entram pelo preso e seus familiares, como televisão, geladeira, ventilador etc. Essas coisas entram junto com armas e drogas. Promover essa mudança implica gastar mais com o preso, e isso encarece o Estado. O preso se vira como pode, em cima da facção criminosa ou do familiar. Hoje, a nossa cultura é essa e tem que mudar: aqui dentro, não, não vai ter nada que eu, Estado, não coloque.

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